Sempre tive verdadeira paixão por uma história bem contada. E esse tipo de narrativa foi me seduzindo em escala crescente e contínua desde os tempos de criança quando olhava a estante de livros que minha mãe tinha em casa. Aquele ambiente literário me fascinava!

A princípio mantive livros ao meu redor, contudo, a narrativa do audiovisual me pegou de jeito com os desenhos animados — na época She-Ra e He-Man eram os meus preferidos — que sempre os assistia quando chegava da escola. Na adolescência, como todo jovem da época, frequentava cinema. Assistia a todos os tipos de filme, sem preconceito. Peregrinava do filme comercial ao cult. Do terror ao religioso.

No entanto, naquela época, eu me divertia com as inventivas narrativas do audiovisual, sem me atentar a dois importantes pontos que, anos mais tarde, vieram para transformar completamente minha vida: a composição dos personagens e a sutileza do contar as histórias em formato de roteiro de longa-metragem, bem como a existência da profissão de roteirista.

A narrativa do audiovisual
Ana Dantas
Documento técnico

Aprendi de cara que um filme é considerado uma obra prima pelo conjunto da sua produção final, entretanto só pode se tornar uma grande película se for baseada num excelente roteiro, numa narrativa do audiovisual impecável. Neste caso, o roteiro audiovisual é apenas o começo de um final feliz.

O que é um roteiro audiovisual? Um roteiro é a forma escrita de qualquer espetáculo audiovisual. Tudo aquilo que vemos nas telas de cinema foi antes colocado em palavras pelos profissionais que chamamos de roteiristas. É um documento narrativo utilizado como diretriz para a gravação de filmes, programas televisivos ou jogos eletrônicos.Com o mercado globalizado e cada vez mais competitivo, as apostas das produtoras estão sempre voltadas para histórias que, além de um eficiente apelo a cerca de sua originalidade, possam prender a audiência do início ao fim e, claro, consigam lhe render lucros consideráveis.

O cinema hoje é um negócio, ainda que sua arte está justaposta nas entrelinhas. Foi-se o tempo em que uma ideia na cabeça e uma câmera na mão por si só já era suficiente para existir. As obras audiovisuais transpuseram as barreiras do cinema e da TV e, deram lugar e espaço, na contemporaneidade, para o mundo virtual.

A narrativa do audiovisual
Ana Dantas
Ligar a audiência do início ao fim

E porque é tão importante ter histórias bem contadas? Atualmente, levar um público significativo às salas de cinemas é um grande desafio. Principalmente com a comodidade dos canais de streaming, do advento das TVs por assinatura com seus vídeos on demand e pay-per-view, ou do vodcast entre tantos outros. Outro ponto que colabora para termos bons roteiros é o zapear ou a dança dos canais, ou seja, é a mais clara tradução de poder do telespectador. Se o que está disponível para ver não interessa, não prende a atenção ou não conquista de cara, a obra audiovisual é substituída por outra com o apoio do botão do controle remoto.

E é aí que nos damos conta da importância de um roteiro bem escrito e estruturado, com uma história envolvente que é capaz de emocionar, criar tensão ou somente divertir o público-alvo. Um roteiro bem escrito tem que conquistar o seu leitor de cara. E aqui eu estou sendo literal. Imagine uma grande produtora recebendo diariamente histórias de inúmeros roteiristas. Uma pilha infindável de roteiros. Obviamente que o leitor que as seleciona se não ficar encantado pelas primeiras páginas da escrita narrativa, certamente, não investirá seu tempo seguindo a leitura à diante.

Com tamanha competição mercadológica, roteiristas criativos e experientes disponíveis no mercado se dedicam com afinco para tirar a sua história do papel. E o que acontece, muitas vezes, com o roteirista iniciante? Por vezes se submete a criações gratuitas que o mercado intitula de “parceria”. Não adianta tapar o sol com a peneira, o processo para um roteirista iniciante chamar atenção para sua obra é desafiador. Isto é fato!

A narrativa do audiovisual
Ana Dantas
Experienciar em ação

Em virtude de todo este cenário, minha dica é: Ouse! Aqueles que se acovardam dentro de uma situação imposta do mercado, certamente, não são merecedores da colheita do sucesso. Dito isto, ouse, entretanto, esteja em plena consciência de suas escolhas e do que ela poderá lhe trazer como experiência sublime. As dez primeiras páginas são cruciais na escrita criativa de um roteiro. Então, a palavra de ordem é encantar o leitor desde os primeiros acordes da história.

Escrever um roteiro audiovisual exige concentração e autoconhecimento, principalmente quando o roteirista cria em casa e/ou sozinho. Entretanto esse ato impõe organização e, ao mesmo tempo, abandono. Duas essências tão indispensáveis e dicotômicas nesta arte. O primeiro se adquire através do método e o segundo através do silêncio mental. O domínio sobre o que se escreve é fundamental, trata-se da autoridade sobre a história que quer se contar ou que está sendo contada. O abandono — no sentido de desapego dos excessos ou da presença de irrelevâncias daquilo que foi dito — é engrandecedor, pois estabelece parâmetros de outras leituras do mundo e/ou aberturas de visões para determinados fatos historiados.

O melhor é ler muito e, mais do que isso, viver. Claro: viver, pois como é que um roteirista pode ter referências verossímeis de vida, de possíveis personagens e/ou de atitudes diversas se só fica trancafiado em casa? Viver a vida é um dos melhores elixires para revigorar e oxigenar um cérebro criativo. Escrever roteiros para o audiovisual é a minha especialidade, entretanto, antes de qualquer escrita, eu vivencio o mundo que me cerca.